Em uma decisão que consolida a proteção dos direitos dos servidores públicos, o Supremo Tribunal Federal (STF), através do Ministro Presidente Luis Roberto Barroso, negou provimento ao Recurso Extraordinário 1.490.045, movido pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).
A universidade buscava reverter uma decisão que assegurou, mais uma vez, o pagamento de adicional noturno a uma de suas servidoras.
O recurso, interposto pela UERJ, contestava a decisão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), que havia concedido o adicional noturno à servidora com fundamento nos artigos 7º, IX, e 39, § 3º da Constituição Federal, além do artigo 83, V da Constituição Estadual, destacando que a omissão legislativa não pode inviabilizar a aplicação dos direitos sociais.
Ao analisar o recurso, o Ministro Luís Roberto Barroso, Presidente do STF, concluiu que a análise das alegadas violações constitucionais exigiria a revisão da legislação infraconstitucional, o que é vedado em sede de recurso extraordinário. A decisão mencionou as Súmulas nº 279 e 280 do STF, que impedem o reexame de provas e a interpretação de legislação local em tais recursos.
A decisão que garantiu o adicional noturno à servidora da UERJ foi publicada no dia 29 de abril de 2024, e reafirma a defesa de direitos sociais, assim como a interpretação do STF sobre a limitação do recurso extraordinário na análise de questões envolvendo legislação infraconstitucional.
Com esta decisão, o STF envia uma mensagem clara sobre a proteção dos direitos trabalhistas e a necessidade de legislações estaduais e municipais cumprirem plenamente os direitos sociais previstos na Constituição Federal, garantindo que mesmo a omissão legislativa não prejudique os servidores públicos.
ENTENDA O CASO
Fato é que o direito à percepção de adicional noturno é aos servidores públicos civis do Rio de Janeiro uma garantia constitucional que se classifica como direito, portanto norma de eficácia plena. Muito embora o legislador não tenha tido o cuidado de regulamentar o adicional noturno como direito dos servidores públicos no âmbito estadual, é imperioso o dever de pagar em favor dos servidores.
Essa omissão legislativa inclusive já foi levada em consideração pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça Fluminense mediante provocação pelo remédio constitucional do Mandado de Injução, ferramenta essencial ao exercício dos direitos garantidos na Constituição e não normatizados, conforme se vê do acórdão do processo nº 0039303-26.2017.8.19.0000.
Direito Constitucional. Mandado de Injunção. Servidor público estadual que ocupa o cargo de Técnico de Enfermagem. Ausência de normatização do direito ao adicional noturno pelo Chefe do Poder Executivo. Pretensão de provimento jurisdicional que assegure ao impetrante o exercício do direito. Cabimento. A Constituição da República assegura aos trabalhadores remuneração do trabalho noturno superior à do diurno, de acordo com o art. 7º, IX e art. 39, §3º da CR e artigos 39 e 83, V da Constituição Estadual. A partir do julgamento do mandado de injunção nº 670, a jurisprudência do Pretório Excelso evoluiu sobre o tema e passou a adotar uma posição concretista, segundo a qual a decisão que concede o mandado de injunção deve viabilizar a fruição concreta do direito, cabendo ao Judiciário, no exercício da sua função jurisdicional conferida pela Constituição de apreciar qualquer lesão e ameaça a direito que lhe for apresentada, assegurar o efetivo exercício da prerrogativa constitucional carente de normatização, e não apenas declarar a mora legislativa. “Diante da lacuna legislativa e da mora do impetrado no que tange à regulamentação do adicional noturno para os servidores públicos estaduais, técnicos e auxiliares de enfermagem, deve ser aplicado ao ora impetrante, de forma analógica, o disposto no art. 73 da Consolidação das Leis do Trabalho, que fixa o adicional noturno em 20% sobre a hora diurna, no trabalho executado entre às 22:00 h de um dia e às 5:00 h do dia seguinte.” (extraído do parecer ministerial). O fato de o trabalho do servidor público estadual ser exercido em regime de plantão não afasta o direito ao adicional noturno, devido em virtude do maior desgaste sofrido no respectivo período. Precedentes deste Órgão Julgador sobre o tema: Mandados de Injunção nº 0024152-54.2016.8.19.0000; 0047264-33.2008.8.19.0000 (2008.046.00003) e 0062421-36.2014.8.19.0000. Concessão da ordem para declarar a omissão legislativa e viabilizar, em concreto, o exercício do direito constitucional do servidor.
Farta é a jurisprudência deste Tribunal a favor dos Servidores Públicos do Estado do Rio de Janeiro que milita a favor destes servidores:
- 0240816-08.2018.8.19.0001 – APELAÇÃO. Des(a). ANDRE EMILIO RIBEIRO VON MELENTOVYTCH – Julgamento: 30/06/2022 – VIGÉSIMA PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL – LEADING CASE DE SERVIDOR DA UERJ
- 0031974-84.2022.8.19.0000 – Mandado de Injunção. Des(a). SUELY LOPES MAGALHÃES – Julgamento: 05/09/2022 – OE – SECRETARIA DO TRIBUNAL PLENO E ORGAO ESPECIAL;
- 0008444-71.2016.8.19.0029 – APELAÇÃO. Des(a). MARIANNA FUX – Julgamento: 01/09/2022 – VIGÉSIMA QUINTA CÂMARA CÍVEL;
- 0238324-09.2019.8.19.0001 – APELAÇÃO. Des(a). GILBERTO CAMPISTA GUARINO – Julgamento: 10/08/2022 – DÉCIMA QUARTA CÂMARA CÍVEL;
- 0063734-85.2021.8.19.0000 – MANDADO DE INJUNÇÃO. Des(a). ELISABETE FILIZZOLA ASSUNÇÃO – Julgamento: 04/04/2022 – OE – SECRETARIA DO TRIBUNAL PLENO E ORGAO ESPECIAL.
Aliás, o tema 1.038 de repercussão geral do Supremo Tribunal Federal encontra-se assim, ementado:
I – A Constituição Federal não prevê adicional noturno aos Militares Estaduais ou Distritais.
II – Mandado de Injunção será cabível para que se apliquem, aos militares estaduais, as normas que regulamentam o adicional noturno dos servidores públicos civis, desde que o direito a tal parcela remuneratória esteja expressamente previsto na Constituição Estadual ou na Lei Orgânica do Distrito Federal.
Verificada a lacuna legislativa no tocante à efetiva regulamentação do adicional noturno a ser pago aos servidores públicos civis estaduais, até que venha à lume a normatização necessária, deve ser aplicado ao caso, por analogia, na forma de remansosa jurisprudência deste Tribunal, o disposto no artigo 73 da Consolidação das Leis Trabalhistas referente às horas efetivamente trabalhadas pelo(a) requerente no horário noturno no percentual de 20%, compreendido entre às 22 horas de um dia, às 5 horas da manhã do dia seguinte.
Decorre, pois, a aplicação imediata do disposto nos artigos 39, §3º, da Constituição da República e, ainda, do art. 83, V, da Constituição do Estado, para garantir o pagamento de adicional noturno aos servidores públicos efetivos, bem como sobre a incidência da referida verba para servidores ocupantes de cargos em regime de plantão.
A matéria tratada nestes autos não é nova, tendo sido, inclusive, objeto apreciação pelo Órgão Especial deste e. Tribunal em vários mandados de injunção, sendo de todo pertinente ressaltar que foi reconhecido que o Estado, apesar de devidamente notificado da mora legislativa (Processo nº. 2005.046.00001), permaneceu inerte por mais de 20 anos para a regulamentação de um direito previsto na Constitucional Federal e na Constituição Estadual sendo, então, conferido a determinado mandado de injunção natureza mandamental e não simplesmente declaratória (Processo nº. 0047264- 33.2008.8.19.0000 ou antigo 2008.046.00003).
MANDADO DE INJUNÇÃO. ENTIDADE DE CLASSE. OMISSÃO LEGISLATIVA REFERENTE A REGULAMENTAÇÃO DO DIREITO CONSTITUCIONAL, AOS SERVIDORES PÚBLICOS, DA PERCEPÇÃO DE ADICIONAL NOTURNO. Segundo entendimento atual de nosso Pretório Excelso, nos termos do art. 5º, inc. LXXI da Constituição Federal, o mandado de injunção há que ser adotado como uma forma de prestação jurisdicional, em um sentido concreto, e não como mera ação declaratória. Lacuna legislativa, que se prorroga por cerca de 20 anos, tendo o Estado sido notificado para adoção das medidas necessárias, quanto ao direito do servidor público perceber remuneração superior, em razão do desempenho do horário noturno, nos termos dos artigos 39 § 3º da C.F. e 83, inc. V da Constituição Estadual, esta também prevista 73 da LCT, ocasionando evidente prejuízo às conquistas previstas no art. 7º de nossa Carta Magna. Situação em que se verifica tratamento diferenciado no que concerne ao respeito a direitos trabalhistas fundamentais. Inexistindo previsão legislativa adota-se o percentual de 20% (vinte por cento) previsto na Consolidação das Leis do Trabalho, até que a legislação estadual discipline o tema. Ausência de violação ao princípio da separação dos Poderes, ante a supremacia das normas constitucionais fundamentais. Gratificação que era paga a servidores da área da saúde e que a veio a ser cortada nos anos de 1999. Procedência do pedido para garantir aos filiados do SINDSPREV/RJ que a remuneração noturna seja acrescida em 20% até que sobrevenha legislação estadual disciplinando a matéria. (0047264-33.2008.8.19.0000 (2008.046.00003), Relator: DES. ALEXANDRE H. P. VARELLA, Julgamento: 31/08/2009).
54Vale destacar que tal direito também está previsto na Constituição do Estado do Rio de Janeiro, que, em seu art.83:
“Aos servidores públicos civis ficam assegurados, além de outros que a lei estabelecer, os seguintes direitos:
[…]
V – Remuneração do trabalho noturno superior à do diurno.”